A Academia dos Champs (ADC) é uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) destinada a crianças e jovens em situação de vulnerabilidade social que utiliza a prática do Ténis como ferramenta de integração social. Ao recorrer à prática desportiva e aos valores a ela associados, a ADC está a contribuir para o desenvolvimento pessoal e social dos seus alunos. Desta forma, as crianças e jovens que frequentam a Academia podem almejar por melhores e mais estruturadas perspectivas de vida. O primeiro núcleo da Academia foi criado em 2009, em Carnaxide, sendo que actualmente existem mais oito núcleos de Norte a Sul do País: Alcabideche, Bicesse, Carcavelos, Faro, Lisboa, Loulé, Maia e Trajouce. O jornal ‘Correio da Linha’ falou com Pedro Carvalho, director da Academia dos Champs, para ficar a conhecer melhor este projecto.
O Correio da Linha (CL) – Como surgiu a ideia de criar a Academia dos Champs?
Pedro Carvalho (PC)– A ideia de criar a Academia nasceu da motivação e vontade do seu fundador, António Champalimaud, em partilhar a sua experiência pessoal enquanto desportista para motivar jovens em situação de vulnerabilidade social. Neste caso – e através do trabalho de toda a equipa da ADC – levando os seus alunos a adoptarem, desde cedo, uma filosofia de vida com uma forte ligação à prática desportiva, que por sua vez os ajudará no caminho do sucesso, tanto a nível pessoal como profissional.
CL – Qual o principal objectivo da Academia?
PC – Mais do que formar campeões de Ténis, o trabalho da ADC passa, sobretudo, por formar Campeões para a Vida. E a ferramenta encontrada para trilhar esse caminho de formação passa pela prática desportiva que, com os seus inúmeros desafios, permite às crianças e jovens do projecto testarem constantemente as suas capacidades, ao mesmo tempo que lhes incute valores tão importantes como a resiliência, o superar-se a si mesmo (especialmente depois de uma contrariedade), a disciplina, o compromisso ou o respeito pelo outro. Valores que ao longo da sua vida serão aplicados nos diversos caminhos que irão seguir.
CL – Porquê a aposta no Ténis?
PC – Essencialmente por ser uma das modalidades mais completas a todos os níveis, lançando vários desafios para além do físico. Se for praticado individualmente é um teste permanente à capacidade do aluno. É ele quem define a estratégia e os objectivos de jogo, tal como terá um dia de definir em relação à sua vida pessoal e profissional.
Quando perde um encontro, de forma isolada, o aluno aprende a lidar com o desaire, fomentando a resiliência para que volte a treinar, de forma a tentar vencer da próxima vez. Quando praticado em equipa, tal como qualquer outra modalidade, fomenta sentimentos de partilha, espírito de grupo, companheirismo e solidariedade
CL – Recentemente o núcleo da Outurela, em Carnaxide, recebeu a visita do presidente da União de Freguesias de Carnaxide e Queijas, Inigo Pereira, e do presidente da Câmara Municipal de Oeiras, Isaltino Morais, que entregaram à Direcção da Academia a chave para uma nova sala polivalente. Quais as vantagens desta nova sala?
PC– Num claro sinal do reforço da confiança que o Município de Oeiras deposita no trabalho da Academia dos Champs, a nova sala permitirá reforçar o acompanhamento feito junto dos nossos alunos – nomeadamente ao nível do apoio ao estudo – ao mesmo tempo que permitirá a prática de exercício físico, especialmente nos dias em que a meteorologia não permita a normal actividade nos campos de Ténis. No período em que não estiver a ter estas utilizações, a sala servirá de local de trabalho para um ou dois elementos da Academia.
CL – Qual o papel da autarquia neste novo empreendimento?
PC – Tanto o Município de Oeiras como a UF de Carnaxide e Queijas têm apoiado desde a primeira hora da Academia dos Champs, reconhecendo desde sempre a mais-valia do projecto de integração social junto da comunidade local mais jovem, bem como os resultados já verificados em pouco mais de 10 anos de actividade. Essa confiança volta a ser reforçada com o investimento e aposta na infraestrutura polivalente agora inaugurada, permitindo à ADC fortalecer a sua estratégia de longo prazo, o que só possível com apoios duradouros e consistentes como aqueles prestados pelo Município de Oeiras e a UF Carnaxide e Queijas.
CL – Quais os critérios para a escolha das zonas onde implementam os núcleos?
PC– Para a abertura de um núcleo da ADC é necessário reunir alguns pressupostos. Em primeira instância, tem de existir uma comunidade ou população que demonstre carência no tipo de intervenção que oferecemos. Essa comunidade, por sua vez, é identificada por via do trabalho em rede com os parceiros sociais do projecto, que são quem melhor conhece as populações em questão. Estes parceiros sociais são, em alguns casos, apontados pelas autarquias e/ou juntas de freguesia, ao mesmo tempo que estas identificam a infraestrutura desportiva a utilizar. A par de tudo isto, temos obrigatoriamente de reunir financiamento para suportar os custos das aulas de Ténis, sempre com a perspectiva temporal mínima de um trabalho a três anos ou mais, para não menos de 30 alunos, a cujas expectativas temos o dever de corresponder a médio/longo prazo.
CL – Como é um dia-a-dia na Academia?
PC– Entre as 15h00 e as 19h30 – período pós-escolar – os professores de Ténis estão com os alunos no campo de Ténis ou em outras actividades. Em alguns casos, a actividade é acompanhada pelos nossos parceiros sociais, o que permite fortalecer o tal trabalho em rede, sempre em prol dos alunos. A restante equipa da Academia dos Champs trabalha todos os dias no contacto com os parceiros sociais, estabelecimentos de ensino – quando possível – e famílias, ao mesmo tempo que assegura a manutenção de todas as condições para que os núcleos operem em pleno – sem esquecer, na- turalmente, a constante necessidade de captação de apoios, financeiros ou de outro género, que permitam a continuidade do projecto a longo prazo.
CL – Qualquer criança ou jovem pode dirigir-se à Academia e solicitar integrar a mesma?
PC– As portas da Academia dos Champs estão abertas a qualquer criança ou jovem sendo que, preferencialmente, a sua inscrição – completamente gratuita – deve ser efectuada por via dos parceiros sociais. São eles que têm as ferramentas para aferir as reais carências dos alunos que chegam ao projecto, garantindo assim que há um rigor na alocação das vagas que existem para as aulas de Ténis. Em alguns casos, como acontece na Outurela e em Carcavelos, na Quinta da Alagoa, a ADC tem também aulas de Ténis ‘abertas ao público’, que são pagas, sendo que o valor cobrado é posteriormente alocado às aulas de Ténis do projecto de integração social.
CL – No total, quantas crianças e jovens integram os vários núcleos da Academia?
PC– No ano lectivo de 2019/2020 registaram-se no projecto 280 crianças e jovens – 125 raparigas e 155 rapazes – havendo, naturalmente, algumas baixas durante esse período, da mesma forma que outros alunos foram admitidos já com o ano lectivo a decorrer.
CL – Para além do Ténis desenvolvem outro tipo de actividades com as crianças? Contam com algum parceiro nesse âmbito?
PC – Alguns dos nossos parceiros sociais oferecem valências como ATL e apoio ao estudo, pelo que não faria sentido duplicarmos essa oferta. Nos núcleos em que haja essa carência, procuraremos levar a cabo o apoio ao estudo, por exemplo. Já levámos a cabo programas de coaching vocacional para um grupo de alunos pré-seleccionado e proporcionamos outro tipo de experiências aos nossos alunos. Nos eventos de angariação de fundos organizados anualmente, como torneios de Ténis ou eventos de música e entretenimento, integramos alunos da Academia dos Champs nas equipas de organização, onde podem experimentar assumir diversas funções de responsabilidade, como o atendimento ao público ou a arbitragem de um encontro de Ténis. Tão ou mais importante, é poderem sentir o projecto como sendo deles.
CL – Com que apoios financeiros contam para o desenvolvimento das vossas actividades?
PC – O leque de apoios financeiros da ADC engloba mecenas privados, que podem ir desde empresas ou entidades – como é o caso da Foundation Lacoste ou do BNP Paribas Portugal – até particulares, ambos de âmbito nacional ou internacional. A esse lote de apoios juntam-se entidades públicas, mais concretamente algumas autarquias cujo território conta com núcleos da Academia.
CL – Têm também muitas parcerias com entidades desportivas, nomeadamente a Federação Portuguesa de Ténis e com o Club International Football. Quais as mais-valias do estabelecimento deste tipo de parcerias?
PC– O protocolo institucional com a Federação Portuguesa de Ténis prevê, entre outras ajudas, a doação de material desportivo e a possibilidade de alguns alunos poderem frequentar os cursos de formação de arbitragem ou de treinador, mediante regras muito específicas. A parceria com a escola de ténis do Club Internacional de Foot-ball permite, em alguns casos, que alunos da Academia dos Champs frequentem clínicas desportivas em tempo de férias. Simultaneamente, esta escola dá a conhecer o projecto aos seus sócios e utentes, permitindo também que sejam entregues doações de material desportivo nas suas instalações.
CL – A Academia já alcançou várias conquistas e reconhecimentos. Pode enumerar alguns?
PC– Em primeiro lugar, e porque se cumpriu já a primeira década de vida da ADC, a maior e mais importante conquista é termos alunos que entraram no projecto já com 13/14 anos, que entretanto viraram adultos e têm a sua vida profissional, e em alguns casos trabalham mesmo no projecto como assistentes dos professores de Ténis. São eles o melhor exemplo para os mais novos que entram na Academia dos Champs. Obviamente que depois existem os outros prémios, dos quais destacamos o galardão entregue duas vezes (2013 e 2018) pelo ATP Tour, ao abrigo do programa ATP Aces for Charity – a que juntamos nos últimos quatro anos o Alto Patrocínio da Presidência da República para os Prémios Anuais de Mérito da Academia dos Champs.
CL – De que forma as pessoas podem apoiar este projecto?
PC – Os apoios financeiros são importantes pois permitem assegurar as aulas de Ténis da Academia, mas podem ser complementados com a doação de material desportivo dedicado ao Ténis, como raquetes, bolas, calçado e vestuário. A compra de algum merchandising solidário pode igualmente servir para apoiar o projecto, assim como o apadrinhamento de um aluno pelo valor de 200 euros, que corresponde a um ano de aulas de Ténis. A consignação do IRS é outra das formas de contribuir. Esta é uma ajuda que não acarreta qualquer custo para o contribuinte e que faz realmente a diferença na vida dos nossos alunos.
CL – Quais os seus projectos e objectivos para o futuro da Academia?
PC– O grande projecto da Academia dos Champs é de longo prazo, com os resultados a surgirem ao fim de muitos anos, e nem sempre surgindo, infelizmente. O nosso desafio passa por formar seres humanos, por via do desporto, oferecendo-lhes as ferramentas para que possam desenvolver as suas competências sociais e pessoais. Esse é o foco principal, e dentro dos objectivos, trabalhamos todos os dias para reunir condições que nos permitam chegar a cada vez mais crianças e jovens, com mais aulas de Ténis. Quanto maior for o universo de alunos, aumenta a probabilidade de sermos bem-sucedidos e formarmos mais Campeões para a Vida!